No centro de muitos dos desafios enfrentados por empresas de pequeno e médio portes está a produtividade. Quando está comprometida, costuma ser o reflexo de um conjunto de fatores interligados, como modelo de governança ineficiente, falhas na comunicação com os colaboradores e ausência de metas claras e alinhadas à busca por resultados financeiros consistentes. Um estudo da consultoria McKinsey revela que essas organizações operam com 54% da eficiência observada nas grandes corporações. Reduzir essa lacuna geraria um impacto positivo de até 3,4% no produto interno bruto (PIB) do Brasil.
“A produtividade tem mais relação com falta de organização e processos desalinhados do que com problemas relacionados a tecnologias ou de estruturas que precisam de mais gente”, afirma Oliver Kamakura, diretor de multilatinas da consultoria Mercer.
Há sinais clássicos que podem indicar que o desempenho do negócio está aquém do esperado. Clientes insatisfeitos, entregas atrasadas com frequência por parte da equipe, excesso de retrabalho, times sobrecarregados, baixo engajamento dos funcionários e desperdício de recursos são alguns deles. O erro de muitos empreendedores está justamente em focar suas ações nos sintomas, e não nas causas do problema.
Diego Marconatto, professor do doutorado da Fundação Dom Cabral e especialista em crescimento organizacional, enfatiza que o despreparo contribui para uma visão pouco estratégica na hora de compreender a origem dos obstáculos e buscar soluções. “Muitos não têm a noção exata do que é uma empresa e de que precisam criar sistemas repetitivos e sistematizados de aumento de riqueza para seus clientes”, diz. E pontua: “É esse modelo que gera crescimento e rentabilidade também para o negócio”.
Além do eventual despreparo do empreendedor e de seus sócios, a falta de uma visão estratégica e de longo prazo também costuma estar na raiz da baixa produtividade. “Em geral, o corpo gestor das pequenas e médias está focado na operação, apagando incêndios, e não enxerga suas ineficiências nem se preocupa com a melhoria contínua”, diz Rafael Fraga Silveira, sócio da consultoria Falconi. “Atividades que poderiam estar automatizadas, como contas a pagar e receber e folha salarial, ainda são feitas à mão ou em planilhas de Excel”, provocando perda de tempo e resultados insatisfatórios.
Ao perceber que o desempenho da empresa está abaixo do esperado, é preciso agir rápido para o problema não se agravar. É fundamental rever processos, reavaliar o modelo de governança e estabelecer métricas claras que devem ser comunicadas com exatidão para os funcionários.
Na cadeira do estrategista
“A delegação de responsabilidades, a adoção de metodologias ágeis, como Scrum [modelo que organiza o trabalho em ciclos curtos com metas claras] e Kanban [sistema visual de gestão de tarefas por etapas], e o monitoramento do desempenho dos colaboradores impulsionam a eficiência e a competitividade”, avalia Décio Lima, presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). “Essas medidas permitirão que as tarefas sejam executadas com o mínimo de desperdício.”
Como os recursos financeiros costumam ser escassos, especialmente nos pequenos negócios, o empreendedor precisa agir de forma cirúrgica para não errar e alocar verba em soluções que podem não ser as mais recomendadas. “Numa grande organização, investimentos que não trazem o resultado esperado são diluídos num bolo maior e não alteram a dinâmica do negócio”, diz Kamakura. “Já numa pequena, há casos em que o gestor tira recursos da produção e investe em ações que não gerarão maior produtividade.” E a crise se agrava.
A vantagem das empresas de menor porte em relação às grandes é a sua maior agilidade para definir e traçar planos de ação. Numa multinacional gigante, as tomadas de decisão passam por várias instâncias e são colegiadas, o que exige tempo. A burocracia é maior, assim como sua estrutura, o que torna a comunicação mais lenta. O dono de um pequeno negócio trabalha próximo da operação, pode observar em tempo real os problemas relacionados a atrasos ou baixo engajamento e consegue testar e avaliar com rapidez e facilidade as ações implementadas.
“Há uma diferença entre o empreendedor trabalhar para o seu negócio e no seu negócio”, ressalta Marconatto, da Fundação Dom Cabral. “Se ele se sentar na cadeira do estrategista, conseguirá crescer de maneira sustentável.”
A força da IA
O uso da inteligência artificial (IA) tem se mostrado forte aliado na busca de uma melhor performance. No Brasil, cerca de 70% das MPEs já estão em processo de adoção de ferramentas baseadas nessa tecnologia, segundo pesquisa da Microsoft em parceria com a Edelman. Embora o índice seja inferior aos 90% registrados entre grandes corporações, o dado ainda é expressivo: mesmo com menos recursos disponíveis, elas estão priorizando esse investimento.
Jean Melle, sócio da consultoria PwC e especialista em supply chain (cadeia de suprimentos), varejo e consumo, lembra que a IA permite a automação de tarefas repetitivas e operacionais que não requerem a percepção do ser humano nem análises. “As pessoas vão fazer cada vez mais aquilo que não está escrito no manual de instrução”, diz. “Elas passarão a ter mais tempo para pensar em questões estratégicas e contribuir com os processos de inovação.”
Isso não se traduzirá, obrigatoriamente, em demissões em massa, mas numa tendência de equipes bem dimensionadas. “Antes de contratar um profissional para o seu time, o empreendedor deve pensar em qual tecnologia pode implementar no lugar”, afirma Silveira, da Falconi. “Ele pode deixar de inchar sua equipe e passar a contar com ferramentas que vão aumentar sua produtividade.”
A pesquisa “Previsões de Negócios com IA para 2025”, da PwC, mostra que 83% das empresas de alto desempenho estão gerando valor ao usar a IA generativa para inovar em produtos e serviços. No setor de varejo e consumo, por exemplo, 63% dos líderes afirmam que a adoção da tecnologia trouxe ganhos de eficiência no uso do tempo dos funcionários, enquanto 34% relatam aumento de receita. “Vimos o impacto que a internet produziu no mundo, acompanhamos as transformações geradas pelo smartphone e agora teremos a terceira grande disrupção com a IA”, diz Melle.
Inovação a serviço da eficiência
Negócios com baixa produtividade tendem a ter dificuldade para investir em inovação. A ausência de governança eficiente, processos claros e rotinas estruturadas consome a energia do empreendedor e compromete o planejamento futuro. Esse cenário pode gerar estagnação, desperdício, escassez de oportunidades, vulnerabilidade a crises e menor lucratividade.
“A criação de uma cultura de inovação e aprendizado contínuo permite que a equipe esteja sempre preparada para novos desafios”, afirma Lima, do Sebrae. “Empresas que inovam se tornam mais resilientes e preparadas para enfrentar os obstáculos, garantindo sustentabilidade e crescimento a longo prazo.”
Segundo pesquisa da PwC, 45% dos executivos brasileiros não acreditam que seus negócios sobreviverão por mais de dez anos se não se reinventarem. Em 2023, eram 41%. Foco em produtividade e eficiência é a base da inovação: “Trata-se de um processo de disciplina”, diz Silveira, da Falconi. “O empreendedor tem que estar sempre buscando por ela e ter um funil para triar o que é bom e aquilo que não é. Caso contrário, vai perder dinheiro.”
Fonte: Pequenas Empresas & Grandes Negócios